O nascimento e a morte que constituem a depressão ocorrem simultaneamente.
Há pouco tempo, voltei a um bosque em que brincara quando criança e vi
um carvalho, enobrecido por cem anos, em cuja sombra eu costumava brincar
com meu irmão. Em vinte anos, uma enorme trepadeira grudara-se a essa árvore
sólida e quase a sufocara. Era difícil dizer onde a árvore terminava e a trepadeira
começava. Esta enrolara-se tão completamente em torno da estrutura dos galhos
da árvore que suas folhas pareciam à distância ser as da árvore. Só bem de perto
podia-se ver como haviam sobrado poucos ramos vivos e quão poucos gravetos
desesperados brotavam do carvalho, espetando-se como uma fileira de polegares
do tronco maciço, suas folhas continuando o processo de fotossíntese ao modo
ignorante da biologia mecânica.
Tendo acabado de sair de uma depressão severa, na qual eu dificilmente
acolhia os problemas de outras pessoas, me senti cúmplice daquela árvore. Minha
depressão havia tomado conta de mim como aquela trepadeira dominara o
carvalho. Ela me sugou, uma coisa que se embrulhara à minha volta, feia e mais
viva do que eu. Com vida própria, pouco a pouco asfixiara toda a minha vida. No
pior estágio de uma depressão severa, eu tinha estados de espírito que não reconhecia
como meus; pertenciam à depressão, tão certamente quanto as folhas
naqueles altos ramos da árvore pertenciam à trepadeira. Quando tentei pensar
claramente sobre isso, senti que minha mente estava emparedada, não podia se
expandir em nenhuma direção. Eu sabia que o sol estava nascendo e se pondo,
mas pouco de sua luz chegava a mim. Sentia-me afundando sob algo mais forte
do que eu. Primeiro, não conseguia usar os tornozelos, depois não conseguia controlar
os joelhos e em seguida minha cintura começou a se vergar sob o peso do
esforço, e então os ombros se viraram para dentro. No final, eu estava comprimido
e fetal, esvaziado por essa coisa que me esmagava sem me abraçar. Suas gavinhas
ameaçavam pulverizar minha cabeça, minha coragem e meu estômago,
quebrar-me os ossos e ressecar meu corpo. Ela continuava a se empanturrar de
mim quando já parecia não ter sobrado nada para alimentá-la.
Eu não era suficientemente forte para parar de respirar. Sabia que jamais poderia
matar essa trepadeira da depressão. Assim, tudo que eu queria era que ela
me deixasse morrer. Mas ela se apoderara de minha energia. Eu precisaria me
matar, ela não me mataria. Se meu tronco estava apodrecendo, essa coisa que se
alimentava dele estava agora forte demais para deixá-lo cair. Ela se tornara um
apoio alternativo para o que destruíra. No canto mais apertado da cama, rachado
e atormentado por essa coisa que ninguém parecia ver, eu rezava para um Deus
no qual nunca acreditara inteiramente e pedia libertação. Teria ficado feliz com
uma morte dolorosa, embora estivesse letárgico demais até para conceber o suicídio.
Cada segundo de vida me feria. Porque essa coisa drenara tudo que fluía de
mim, eu não podia sequer chorar. Até a minha boca estava ressecada. Eu pensava
que, quando nos sentimos muito mal, as lágrimas jorrassem, mas a pior dor possível
é a dor árida da violação total que chega depois de todas as lágrimas já terem
se exaurido. A dor que veda cada espaço através do qual você antes entrava em
contato com o mundo, ou o mundo com você. Essa é a presença da depressão
severa.
Andrew Solomon - O demônio do meio dia
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